segunda-feira, 31 de março de 2008

Dias de Melo (1)

Aleijadas
Vacilantes
As minhas pernas
Tão trôpegas
Aleijadas
Vacilantes
Que tenho de me amparar
Ao meu bordão

Quando vou caminhando
Corpo cansado
Corpo trémulo
Corpo febril
Tão cansado
Trémulo
Febril
Que tenho de me amparar
Ao meu bordão

Quando vou caminhando
Vendo mal
Ouvindo mal
Respirando mal
Amparado
Ao meu bordão

Quem passa por mim
Não o vejo bem
Oiço-o mal
Às vezes nem o chego a perceber
Nem sempre o reconheço
E fico-me
Amparado ao meu bordão

Quando vou caminhando
Assim
Arrastando-me
Amparado ao meu bordão
Sou um espectáculo para os jovens.
Pensam
Que nunca chegarão a velhos.
Como eu outrora
Em jovem
Como eu outrora

Nasceu na freguesia da Calheta de Nesquim, concelho de Lajes do Pico, em 8 de Abril de 1925. Fez a instrução primária na freguesia natal e o curso do Liceu e Magistério Primário na Horta. Foi professor Ponta Delgada, Cova da Piedade e mais tarde nas Lajes do Pico.
Por volta dos 12, 13 anos principiou a escrever para o jornal “O Telégrafo”.
Mais tarde, iniciou a sua colaboração assídua na Imprensa Regional, principalmente nos jornais “Açores” e “Ilha”, e na Imprensa Nacional, no “Diário de Notícias” e “Diário de Lisboa”.
Nos seus quase trinta livros já publicados, Dias de Melo não esconde a sua predilecção por temas como a emigração e a baleação, particularmente na Ilha do Pico.
Uma nota dominante em todos os seus escritos é a sua empatia, ou até mesmo simpatia, para com as personagens socialmente desprotegidas, vítimas da prepotência dos poderes dominantes, da insensibilidade de outros e das forças incontroláveis da natureza insular.
Adaptado de http://casadotriangulo.com/

quinta-feira, 27 de março de 2008

Por que carga de água a Secretaria do Ambiente e do Mar não tem sede no Pico?

Secretaria Regional do Ambiente e do Mar



Na penúltima visita do Governo Regional ao Pico, em Outubro 2007, a sra secretária do Ambiente e do Mar, Ana Paula Marques, afirmou que o processo de reclassificação das áreas protegidas dos Açores iniciar-se-ia pelo Pico, por esta ilha ser a que "mais área protegida tem" e por ter, também, "mais potencial para o turismo ecológico".
Como é sabido, esta posição não é estritamente pessoal, ou mesmo regional, mas também é corroborada pela própria UNESCO, veja-se o caso da paisagem protegida.


Ora sabemos que só um acompanhamento “in loco” será capaz de preservar e proteger convenientemente uma riqueza que, afinal, é universal.

Foi com este conhecimento que os açorianos e madeirenses lutaram por organismos próprios, mais próximos das populações, em detrimento do centralismo do Terreiro do Paço.
E prosseguindo com este raciocínio evitou-se a concentração de secretarias em S. Miguel, pois considera-se que quanto maior é a proximidade aos problemas, melhor se resolvem as situações.
Nada mais elementar.

Mas, a ser tomada esta decisão, não se correria o risco de a Secretaria ficar numa ilha isolada?
Ora, o Pico ocupa uma posição equidistante entre as ilhas do grupo central, logo, situa-se no meio e não na periferia do Arquipélago. A sua proximidade a S Jorge, Faial e até mesmo à Terceira são mais valias da sua localização
Pertencemos, também, ao grupo de ilhas mais desenvolvidas, tais como S. Miguel, Terceira e Faial, indo já longe o tempo em que não havia comunicações com o exterior.

Resumindo, reunimos todas as condições e apenas falta passar das palavras aos actos.


Claro que os adversários da descentralização, a verdadeira essência da autonomia, acenarão com o papão do bairrismo da ilha, com o propósito de impedir o desenvolvimento harmónico dos Açores e acentuar as assimetrias.

Só que, desta vez, os picoenses sabem que a Secretaria do Ambiente poderá até ficar na ponta da doca da Madalena, o mais próximo do Faial que se consegue arranjar, pois o importante é ficar na ilha.

Para dar um salto qualitativo é imprescindível que o Pico detenha um centro de decisão e se acabe, de uma vez por todas, com a exclusiva subordinação imposta a uma ilha gigante, continuamente à espera do futuro.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Celso Emílio Ferreiro (1914-1979)


O PROFETA

Pouco antes de morrer
disse ele ao povo:
Deus te dê ira,
que paciência tens de mais.

Tradução de Pedro da Silveira

quinta-feira, 20 de março de 2008

Semântica macarrónica – copiado de Vitorino, com erros

Fig 1 Aeroporto do Pico à noite ANTES. Fig 2 APÓS o investimento na iluminação da pista


Caro certificador da iluminação da pista do aeroporto do Pico,
ou na ausência de um responsável desencarapuçado,
caro Duarte Ponte:

Solicito ao certificador que certifique com certificado
Solicito ao certificador que acerte o acertado
Acertadamente?
Certamente
Mas terá também sido certificado, esse certificador?
Estará certo do prazo
Em paradeiro certo
Ou estarão demasiado incertos
Esses certificadores?
Cuidado com a retenção da certidão
de teor
alcoólico por certo na graduação
Ou inda estala o balão
certificado
Que também é graduado
Quebrado o certificado?
E já não há certidões
certificadas
Seja como for
Então resolvo tomar acertos
Enfim dos certos
Menores, maiores,
Mas diz-me o certificador
Que não posso certificar
Aeroporto que é pato
Certo?
Certamente
Assertivamente
Só se certifica
A suina
Da politica.
Sucintamente
Só nalguma candeia
Às avessas
Daquelas
Só p’ra vista

sexta-feira, 14 de março de 2008

César, Irving e a futura maternidade do Pico

César prometeu um bloco de partos para o Pico. E fê-lo na sua qualidade de Presidente do Governo Regional. Não na de um inexperiente candidato socialista ao cargo de presidente do governo.
Não, este anúncio foi feito durante uma visita estatutária ao Pico e não numa acção de campanha do PS.
E nós interpretámos esta decisão, como o reconhecimento do imenso sacrifício e dor suportado pelas mães do Pico. Sempre corajosas.
E no nosso íntimo, anuímos que a justiça tardara mas sempre acabara por chegar.
Que a provação não fora em vão.
Que todas as lágrimas, todo o sofrimento, todas as privações não mais seriam prolongadas por um parto longe e distante. Previamente maltratado no revolver das ondas.

Só que na última visita, também estatutária, alguém se esqueceu de dar continuidade a esta deliberação.
Estamos em crer que terá sido por lapso. Daqueles lapsos que nós temos quando, por demasiado óbvios nos parecerem os factos, achamos desnecessários e repetitivos ter de voltar a mencioná-los.
Só pode ser esta a explicação, pois não acreditamos que alguém se atreva a brincar com o sofrimento dos outros. E que fique impune.
Muito menos um estadista responsável e nada novato nestas andanças.
Sabemos até, que Irving, famoso historiador britânico foi parar à cadeia por desrespeitar o sofrimento dos outros.
E nós aplaudimos.
Este senhor teve a ousadia e o desplante de afirmar que o holocausto não existiu. Que o padecimento alheio, afinal tinha sido ilusão.
Por cá, suspiramos de alívio, pois consideramo-nos rodeados de humanistas. Cremos ser governados por pessoas sensíveis, responsáveis e com elevado sentido de estado.
Porque se acreditássemos que o tal lapso tinha sido propositado, então seríamos os primeiros a exigir pena idêntica a Irving.

quinta-feira, 13 de março de 2008

A verdade era bela


(...)

A verdade era bela
mas doía nos olhos
mas doía nos lábios
mas doía no peito
dos que davam por ela.




Sebastião da Gama nasceu no dia 10 de Abril de 1924 em Vila Nogueira de Azeitão. Licenciado em Filologia Românica, pela Faculdade de Letras de Lisboa, foi professor do Ensino Técnico Profissional. Estreou-se nas letras no ano de 1945, com o livro Serra-Mãe. Colaborador de revistas como Mundo Literário, Árvore e Távola Redonda, realizou também algumas palestras e conferências. A sua carreira foi abruptamente interrompida pela morte, causada pela tuberculose, decorria o ano de 1952.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Onde pára a coesão?

O Presidente do Governo na Assembleia Regional anunciou as seguintes medidas: (...) será implementado o apoio em 90% do custo de transporte de uma lista de produtos de origem regional das chamadas “ilhas da coesão” para as outras ilhas e o apoio em 75% no custo do transporte de flores, plantas ornamentais e de alguns frutos para o exterior(...)
(http://www.azorianos.blogspot.com/).


Delegação dos Serviços Sociais?

Não tive acesso à lista de produtos a serem apoiados, sei, contudo, que estão em causa milhões e que estes, injustamente, não chegarão ao Pico. Pois, à semelhança do alfaiate, tiraram as medidas primeiro, para depois fazerem o fato. Quero dizer que primeiro pretenderam excluir o Pico dos apoios, para depois escolherem os critérios da sua exclusão.
E que bem escolhidos que eles foram...
Qualquer terráqueo, por mais distraído que seja, apercebe-se da maior semelhança entre o Pico e as ditas “ilhas de coesão” do que com o Faial, S. Miguel e Terceira.
Tomando o Faial como exemplo, a mais pobrezinha deste grupo, reparamos que lá estão sedeadas a Assembleia Regional, um Departamento da Universidade dos Açores, duas Secretarias Regionais: Secretaria Regional da Agricultura e Florestas e a Secretaria Regional do Ambiente e do Mar, para não falar das Direcções Regionais, Hospital, entre outras.
Tudo investimento público que cria empregos e fixa gente, enfim, gera riqueza.
Como se tudo isto não bastasse, “roubam” mais uma vez o Pico (“roubar” é mesmo a palavra que se usa).
Claro que com a complacência de todos aqueles que foram eleitos para defender o Pico e já viram isto há muito tempo, mas preferem assobiar para o ar na defesa do seu “tacho” (neste caso “tacho” tem apenas um sentido figurado, pois não se relaciona com panela ou caçarola).
Haja decência!

quinta-feira, 6 de março de 2008

No País dos Sacanas

Que adianta dizer-se que é um país de sacanas?
Todos os são, mesmo os melhores, às suas horas,
e todos estão contentes de se saberem sacanas.
Não há mesmo melhor do que uma sacanice
para poder funcionar fraternalmente
a humidade de próstata ou das glandulas lacrimais,
para além das rivalidades, invejas e mesquinharias
em que tanto se dividem e afinal se irmanam.

Dizer-se que é de heróis e santos o país,
a ver se se convencem e puxam para cima as calças?
Para quê, se toda a gente sabe que só asnos,
ingénuos e sacaneados é que foram disso?

Não, o melhor seria aguentar, fazendo que se ignora.
Mas claro que logo todos pensam que isto é o cúmulo da sacanice,
porque no país dos sacanas, ninguém pode entender
que a nobreza, a dignidade, a independência, a
justiça, a bondade, etc., etc., sejam
outra coisa que não patifaria de sacanas refinados
a um ponto que os mais não são capazes de atingir.
No país dos sacanas, ser sacana e meio?
Não, que toda a gente já é pelo menos dois.
Como ser-se então nesse país? Não ser-se?
Ser ou não ser, eis a questão, dir-se-ia.
Mas isso foi no teatro, e o gajo morreu na mesma.



Jorge de Sena (1919-1978)
Filho tardio e único de Augusto Raposo de Sena, natural dos Açores e comandante da marinha mercante. Teve uma infância retirada e infeliz, tendo feito a instrução primária e os primeiros anos do liceu no antigo Colégio Vasco da Gama e o curso liceal no Liceu Camões, onde foi aluno de Rómulo de Carvalho.
Na Faculdade de Ciências de Lisboa efectua os estudos preparatórios para entrada na Escola Naval, com altíssimas classificações, sendo a ela admitido em 1937.
Após uma "viagem de instrução" no navio-escola Sagres, é-lhe recusado o acesso a Oficial de Marinha, por falta de perfil necessário. Dessa ferida jamais se curará, visto o mar e o que este supõe de "andanças" ter-lhe sempre sido uma profunda atracção.
Jorge de Sena opta, então, pela engenharia civil, no Porto. Conclui o curso em 1944, mas, antes, publicara o seu primeiro livro de poesia, Perseguição, que passou quase despercebido.
Participou num golpe revolucionário abortado que poderia vir a ter, eventualmente, consequências, o que o levou a fixar-se entre 1959 e 1965 no Brasil, ano em que a situação política neste país o leva a mudar-se para os Estados Unidos.
Nos Estados Unidos, Sena começou por aceitar o cargo de "visiting professor" na Universidade de Wisconsin, sendo, em 1967 nomeado catedrático do Departamento de Espanhol e Português. Em 1970 mudou-se para Santa Barbara, onde foi nomeado catedrático efectivo do Departamento de Espanhol e Português e director do Departamento de Literatura Comparada. Aí viria a falecer em 4 de Junho de 1978.

Adaptação livre de Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. IV, Lisb