domingo, 30 de novembro de 2008

Prémio Dardos

O Basalto Negro recebeu de Félix Rodrigues do blog Desambientado o prémio Dardos. Já no mês anterior tinha recebido do blog Candilhes o prémio Óscar. Embora não goste de confessar, é sempre com agrado que o blog recebe estes prémios.
Vou fazer as minhas nomeações, não só porque, segundo dizem, dá azar quebrar a corrente - na verdade, não me tem saído o euromilhões. Mas sobretudo, porque há blogs que eu gostaria de referenciar e dar o meu modesto estímulo.

Nomeados:

Escrita em dia: O grande estratego no incentivo ao debate e à participação cívica picoense.
Fiat Lux – Um blog feito a partir de S. Miguel, mas com o coração no Pico.
Ilha do Pico ao Natural – Está no seu início mas promete divulgar a geo e biodiversidade do Pico.
Anatomia dos Sentidos – Um blog de muito bom gosto do nosso Samuel Soares.
Notas do meu retiro: Um caso de verticalidade e clarividência pouco comuns no nosso meio.
Ardemares: Pelas fotografias do Pico que publica e pelo muito que pode fazer pela nossa ilha.
Candilhes: Uma lufada de ar fresco na blogosfera.
Máquina de Lavar: Um excelente blog, nomeadamente na contextualização histórica dos seus posts.
In Concreto- Pelos seus posts pertinentes, assim como, pelos seus comentadores residentes, que lembram aquilo que os políticos profissionais pensam, mas, por vezes, não dizem.

Por opção, evitei repetir blogs aos quais já anteriormente tinha feito nomeações.

sábado, 29 de novembro de 2008

Bons exemplos (5)


(...)
... E não acabo – não posso! –
a conta dos contos idos,
mais d’agora e que hão de vir,
desta gente picarota
feita de lava e salmouras,
mole na fala, de ferro
nos arriscos do trabalho.
Não posso, não há palavras!

- Ei-los! Ei-los! Lá vêm eles!
E Fernão Alvres ainda!
Que olhar o seu: de ganhoa
que abica ao peixe!
Ele, é ele – a sua mão
Firme na cana do leme!
Pedro da Silveira

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Bons exemplos (4)


Foto retirada da net - O Castelo antes de reconstruído








Sempre conheci o Castelo em ruínas. Como se tivesse sido saqueado e destruído pelos piratas, os seus inimigos naturais.
Consta, no entanto, que o castelo não terá participado em muitas refregas, pois apenas a sua presença era suficientemente dissuasora para afugentar quem se aventurasse a cobiçar o alheio, neste Sul do Pico.
No meu tempo de menino, o castelo era, sobretudo, uma fronteira entre os vilas e os da ribeira do meio.
Dizia-me a minha avó que quem transpusesse esta fronteira de madrugada sujeitava-se a ser espedregado, pois aventuras destas são muito bonitas, mas devem ser feitas às claras.
E foi junto ao castelo que funcionou a primeira central eléctrica que iluminava as Lajes.
Lembro-me muito bem de acompanhar o meu pai, nos seus passeios nocturnos, até esta central.
Um pouco antes da meia-noite, o sr Arnaldo arrefiava a luz, avisando os mais distraídos que eram horas de dormir.
Depois, o sr Arnaldo desligava o único motor da central e um profundo silêncio invadia a vila. Seguia-se a viagem de regresso, agora às escuras, passando pelas portas do cemitério. Estas, devido às suas proporções gigantescas, levavam-me a admitir que os seus moradores seriam também de dimensões do outro mundo.
E, era aqui que o caminho gostava de me amedrontar, de um lado a dita porta, geralmente entreaberta, do lado oposto um despenhadeiro para o mar.
E se era bem verdade que eu não tinha culpa de os mortos estarem mortos, por mim estariam todos bem vivos, não deixava de sentir um calafrio, por eles serem bem capazes de fazerem uma qualquer desfeita, só por terem inveja dos vivos.
Passado o cemitério, surgia um novo obstáculo, a esquadra da polícia. Pois, a meu ver, até aquele meu simpático vizinho, que era agente, se transfigurava num cruel perseguidor de crianças desobedientes. Pelo menos era o que a minha avó me dizia, apontando para um sempre eterno puré de cenoura.
Só quando chegava ao lampião a petróleo que sinalizava a entrada marítima da carreira, à entrada da vila, é que uma infinita alegria me invadia a alma.
Então, insuflava bem os pulmões e corria passeio abaixo, fintando as árvores, até ouvir a voz de pai chamar-me.
Ah, que felicidade era poder regressar a casa, após correr mundo.

Parabéns Madalena

A requalificação do centro da Vila da Madalena, vai ter um investimento de três milhões de euros, com a autarquia a manifestar a convicção de estar no bom caminho para a sua elevação a cidade.

O projecto de requalificação do centro da Vila da Madalena, foi sempre uma intenção de Jorge Rodrigues, desde que foi eleito presidente da autarquia. A requalificação urbana com início previsto para Janeiro de 2009 vai envolver a Avenida Machado Serpa, a Rua Carvalho Araújo, a Rua Maria da Glória Duarte, a Rua Ouvidor Medeiros e mais duas pequenas travessas do centro.

Com uma imagem completamente diferente, a requalificação do concelho vai proporcionar aos seus habitantes uma melhor qualidade de vida desde melhoramentos nos passeios, melhor iluminação, praça de táxis vai desaparecer, sendo distribuídos os táxis por três locais no concelho: zona da saída do cais, Avenida Machado Serpa e na Rua Carlos Dabney.

Uma nova biblioteca, um auditório municipal e um pavilhão multiusos estão também contemplados no projecto de requalificação.

http://www.picoazores.com/noticias/noticia.php?noticia=5237&PHPSESSID=5531976a02ea7b63643b416843ffe000

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Bons exemplos (3)

À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.

Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!
(...)
Eu podia morrer triturado por um motor
Com o sentimento de deliciosa entrega duma mulher possuída.
Atirem-me para dentro das fornalhas!
Metam-me debaixo dos comboios!
Espanquem-me a bordo de navios!
Masoquismo através de maquinismos!
Sadismo de não sei quê moderno e eu e barulho!

Extraído de Ode Triunfal de Álvaro de Campos








Quem conhecia a antiga Fábrica da Baleia de Lajes do Pico e entra neste renovado espaço, não consegue escapar às recordações que a memória evoca, relativamente ao período da baleação.

Quando passo pela caldeira, não consigo evitar um arrepio perante o acidente fatal que vitimou um jovem trabalhador desta indústria.
Pois também se arriscava a vida em terra, na incessante demanda do pão nosso de todos os dias. Por isso, quando ouço alguns jovens bem nutridos e de mãos nos bolsos, saírem de um contexto histórico para associarem a caça à baleia, em décadas passadas, a uma monstruosidade, dá-me vontade de rir.
Continuo a visita e à medida que entro nas salas, fecho os olhos para apurar a memória do cheiro a óleo e a buana de baleia. Até consigo ouvir os estalidos secos dos cabos de aço e das rodas dentadas em movimento. Sobre a rampa deserta haverá sempre um trabalhador que gesticula, induzindo a máquina ao arrasto da baleia.
Contudo, ao abrir os olhos, a realidade fria toma forma e esboço um sorriso amargo. Afinal, os tic tacs não são das gigantescas roldanas, mas de uma numerosa excursão feminina que passeia os seus saltos elegantes num chão impecavelmente envernizado.

Quem diria que, passadas apenas duas décadas, os utilizadores deste recinto cobrissem os seus pés descalços com sapatos tão finos!
Quem diria que o odor intenso a cetáceos em putrefacção fosse substituído pelas últimas fragrâncias da Chanel ou da Dior!
As voltas que este mundo dá!...

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Um outro 25 de Abril

Foto retirada de http://www.ribeiras.com/



A festa de São Marcos patrono dos maridos enganados

Um curioso apontamento sódico das cinco ilhas mais aconchegadas, São Jorge, Faial, Pico, Flores e Corvo, onde predominou a colonização flamenga, é a festa de São Marcos, patrono dos maridos que não podem contar com a fidelidade das mulheres.
A 25 de Abril arma-se em determinada casa um altar, tendo ao alto um corno ou uma coroa de cornos com apropriada ornamentação. A Irmandade de São Marcos, que de tal festa se ocupa, é composta por homens casados, que não devem afronta a suas mulheres. Durante o dia festivo não falta quem se encarregue de chegar à rua, tentando convencer aqueles que vão em seu caminho a vir beijar o corno. Com os protestos indignados dos que não aceitam o convite, começa a galhofa.
À noite, realiza-se a procissão com a coroa levada sob um lençol em forma de pálio, em que a raspa de corno faz as vezes de incenso. Por entre berreiro ensurdecedor, vai procurando as ruas e parando diante de certas casas de seguro ou suposto motivo.
Aqui reside o maior interesse desta desusada festarola, quando as mulheres vêm à janela, em destemperado palavrório, defender a honra dos maridos e insultar os que vão no préstito.

http://km-stressnet.blogspot.com/2007_07_15_archive.html

Nas minhas divagações pela net deparei-me com este belo texto sobre uma tradição que, julgo, já estará perdida.
Apesar do seu autor não ser açoriano, penso que soube captar muito bem o espírito desta tradição.

Lembro-me bem destes rituais, que assistia de longe, com muita curiosidade, e que sempre me intrigaram.
Como era possível a sua existência, julgo que até finais dos anos setenta, numa comunidade tão conservadora como as Lajes?
Como era possível num meio tão pequeno, onde tudo era escondido porque todos dependiam uns dos outros, haver tal delírio?

Não sei responder, mas penso que os mais velhos sabem. E que será uma pena se desaparecerem alguns destes relatos, provavelmente muito antigos. Claro que deve haver omissão de nomes/locais para não ferir susceptibilidades.
Pois, só assim, seria possível ter um conhecimento mais profundo de todas estas representações sociais que pretendiam lidar com situações complexas, e talvez mesmo resolvê-las, expurgando-lhes o drama e estigma.

E talvez assim, os humanos, perante a inevitabilidade de certas leis naturais, fossem levados a concluir que o Criador, a existir, deve ter um grande sentido de humor.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

As fotografias de Goreti Batista

A montanha - Debaixo da pele repuxada, nas veias, corre o basalto negro
S. Jorge ao fundo

O comprimento

O Faial ao fundo

A fumarola do piquinho

A baía das Lajes do Pico, ao fundo
Pormenor da costa do Pico
Ilhéus da Madalena, ou a iguana fitando a presa

O morro de Castelo Branco com o Pico e S. Jorge ao fundo

O vulcão dos Capelinhos
A mão que agarra e segura a ilha

Os docentes de uma escola têm as mais diversas origens, de tal modo que é muito frequente a interpelação: De onde és?
Eu digo que sou do Pico e, invariavelmente, ouço que não tenho sotaque. Já me cansei de dizer que, lá para as minhas bandas, a pronúncia não é acentuada e, regra geral, mudo de tema.
Ouço sempre dizer que a minha ilha é muito bonita, com gentes acolhedoras. Há mesmo quem goste de fazer alguns relatos das suas visitas.
Ou então, como foi o caso da professora Goreti Batista, opte por me mostrar fotografias.
Posso afirmar que fiquei siderado com as fotos da Goreti, pois acho que ela tem fotos dignas de uma exposição, ou mesmo de uma publicação em livro.
E também porque, acima de tudo, ela revela uma grande sensibilidade, que só pode ocorrer devido a uma grande dedicação à fotografia e um amor pelo Pico.

sábado, 1 de novembro de 2008

Um dia será que chegará a todos por igual


O Morto Contente

Numa terra a engordar, com caracóis, bem dura,
Quero eu próprio cavar o buraco profundo,
Onde possa estender minha velha ossatura,
E dormir em sossego, esquecido do mundo.

Odeio o testamento e odeio a sepultura;
E a imolar compaixão, qual o vil vagabundo,
Antes quisera ver minha carcaça impura
Viva ainda servir de pasto ao corvo imundo.

Vermes! larvas brutais, sem olhos, sem ouvidos!
Vede entregar-se a vós um morto descuidado.
Filhos da podridão, asquerosos e tortos,

Sem piedade minai meus restos corrompidos;
E dizei-me se pode ainda ser torturado
Este corpo sem alma e mais morto que os mortos!

Charles Baudelaire (1821-1867) tradução de Pedro da Silveira